Blog do raimundo

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Este é o Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores no Transporte Coletivo Urbano de Goiânia e Região Metropolitana. O sindicato foi fundado em 2009 para representar e tocar as lutas dos rodoviários de nossa região.

domingo, fevereiro 11, 2007

OLHA LÁ, O MOLEQUE TÁ SENDO ESFOLADO!

A cena brutal de uma criança de seis anos sendo esfolada viva tomou conta do imaginário brasileiro dos últimos dias. Foi um símbolo. Tanto da violência, problema social que se agrava cada vez mais, mas principalmente da indiferença. Não apenas das pessoas que cometeram o crime, uma indiferença no mínimo doentia, mas da sociedade.
Não se pode ignorar que a indiferença é um problema social, que atinge a todos. A exclusão social, a pobreza, os mais de cem anos de fim de escravidão que não foram resolvidos. Uma sociedade injusta, competitiva, individualista e conseqüentemente indiferente. Não só no Brasil mas em outros grandes países capitalistas. Li em uma revista recentemente que um manual ensina as mulheres gritarem “fogo” caso estejam sendo estupradas, pois se gritarem que estão sendo violentadas a reação das pessoas é fugir.
Ora, quem já não foi indiferente com a quem está sendo assaltado? Ou com algum caso de corrupção? Indiferença é algo necessário para sobreviver, pois temos uma justiça feroz para quem rouba um bife para alimentar os filhos, mas a bondosa com quem comete crimes brutais.
Por isto me assusta um pouco o fato de a criança ter sido arrastada por quinze quilômetros, os ladrões conseguirem fugir e a denúncia só ter sido feita depois. Eles passaram por ruas movimentadas. Dezenas de pessoas viram. Passaram inclusive perto de postos de policiais, de uma base do exército e de um bar. Tudo a olhos vistos. Alguém denunciou na hora? Alguém se preocupou em chamar a polícia imediatamente? Não. Alguém deve até ter comentado: “olha lá, o moleque ta sendo esfolado” voltou para casa com medo e não fez nada.
Todos nós o esfolamos. A cidade inteira. Claro que a etapa final do processo foi feita por gente sem nenhum sentimento moral, mas a cidade maravilhosa foi cúmplice. A indiferença mata. Mata quando milhões de pessoas são colocadas em guetos sem nenhuma chance de sair de lá. Mata quando muita gente é incapaz de girar a cabeça por quarenta e cinco graus e ver quem está lavando o chão. Quando a exclusão gera um ambiente favorável à violência. Quando uma sociedade corrupta e consumista vende a ilusão de ascenso social rápido e fácil. Quando o valor de uma pessoa é o carro que anda e a roupa que veste.
E aí, quando a indiferença se transforma em susto, pois amanhã pode ser meu filho, surgem as soluções. Diminuição da maioridade penal. Leis mais rigorosas. Pena de morte. Por mais que se institua o esfolamento dos que fizeram isto, não adianta leis se elas não funcionam, ou funcionam de modo diferente para cada casta social. A máquina do estado está fisicamente e moralmente sucateada. A lei não pode estar em todos os lugares em todos os momentos. Mas a indiferença pode. Ela ocupa cada rua, casa janela e cada bueiro da cidade.

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domingo, fevereiro 04, 2007

O CONGRESSO ESTÁ MAIS DE ESQUERDA?

É interessante ver na eleição da câmara dos deputados uma disputa que só se via em eleições de sindicatos e DCEs: PT versus PcdoB. O sonho da social-democracia de eleição após eleição e esquerda ir ganhando deputados até que o congresso tenha uma maioria para implementar o socialismo estaria começando a se concretizar? Vejamos.
Desde o início da implementação do sistema pluripartidário, no fim da ditadura militar, podemos ver um crescimento ininterrupto dos partidos colocados pela mídia de centro e esquerda. Isto tem despertado esperanças em parcelas progressistas do eleitorado e de parte da militância dos movimentos sociais. Considerando como “partidos de esquerda” o PT, PcdoB, PDT, PSB, PPS(antigo PCB), PV, PSOL, PHS e PMN, desde 1982, quando das primeiras eleições livres, podemos observar sim o aumento da “esquerda”. Naquele ano esta esquerda ocupava apenas 7,5% da câmara dos deputados, passando para 9,6% em 1986, 20,1% em 1990 e 22,4% em 1994.
A década de 90 foi um tanto reacionária, fazendo o crescimento ser menor, porém ainda existente A esquerda parlamentar se manteve com os mesmo 22,4% em 1998, quando Fernando Henrique se reelegia. Em 2002, quando o executivo foi ganho por esta esquerda, seu tamanho no congresso foi de 32,5% e em 2006 passou, mesmo com a crise do PT, para 36,8%.
No senado, casa reacionária por natureza, também é observado um perfil diferente dos senadores. Em 1982, quando os senadores biônicos ainda estavam em seus mandatos, os partidos de esquerda tinham apenar um senador. Em 1990 já tinha treze, ou 16,4%. Hoje conta com cerca de 30% das cadeiras.
O PT só parou de crescer em 2006. Em 1982 eram apenas oito petistas, ou 1,7% do congresso. E ainda por cima alguns foram expulsos por votar na eleição indireta para presidente. Depois foi para 35 em 1990, ano posterior à derrota eleitoral de Lula nas eleições contra o hoje senador lulista Fernando Collor. Em 2002 o PT chegou a ter 17,7% do congresso, com 93 deputados, tendo pouco menos que isto hoje. No senado, movimento semelhante acompanha o Partido dos Trabalhadores.
Até que ponto isto é positivo para a classe trabalhadora do país? Será mesmo que Lula só não fez um governo realmente de esquerda porque o congresso ainda não tem uma maioria de esquerda? Se fosse isto então a solução seria “segurar as pontas” do atual governo até, quem sabe em 2010, a maioria do parlamento seja esquerdista. Ledo engano.
É bom notar que, junto com este crescimento do “campo progressista” também houve um crescimento das políticas neoliberais no congresso. Na década de 80 a constituinte conseguiu vários avanços como a auditoria da dívida externa(não realizada até hoje), a inclusão da função social da propriedade e o direito de greve.
Depois, independente do tamanho do PT ou do PDT, ocorreram as privatizações, a política monetária de Fernando Henrique(em voga até hoje) e as reformas que tiram direitos de trabalhadores, como a da previdência. Porque isto acontece?
Porque o que acontece não é um crescimento real de um campo político da classe trabalhadora ou mesmo um campo progressista do congresso, mas sim uma substituição das velhas oligarquias, cada vez mais desgastadas, por novos grupos que agem a favor dos mesmo interesses. Na década de 80, o campo democrático e popular realmente aumentava dentro e, o que é mais importante, fora do parlamento. A constituinte foi um meio de canalizar as mobilizações populares para dentro do regime burguês, mas várias concessões tiveram que ser feitas, pois os sindicatos, o movimento estudantil e a opinião pública como um todo eram atuantes.
Na drástica década de 90 o aumento das legendas de esquerda foi acompanhado contraditoriamente por um enfraquecimento dos movimentos populares e por uma diminuição do pensamento crítico na opinião pública. Isto “descolou” os partidos de esquerda de suas bases sociais, fazendo com que seus burocratas, para sobreviverem, buscassem se tornar políticos adaptados aos interesses das elites.
Hoje algumas dessas legendas se transformaram até mesmo em partidos de aluguel, como o PPS. O que um século não fez com os ex-anarquistas que fundaram o PCB? As que tinham raízes fincadas nos movimento sociais, PT e PCdoB, se transformaram em verdadeiros agentes da classes dominante nos mesmos, aparelhando, burocratizando e desacreditando entidades perante sua base.
Não apenas nas votações ou na “crise ideológica” podemos perceber este fenômeno. Mas em algo bem mais palpável: o financiamento de campanhas. Um diferencial entre uma candidatura com respaldo popular e uma candidatura das elites é o dinheiro gasto nas campanhas, afinal um candidato realmente popular não precisa das grandes fortunas que os coronéis precisam para garantir votos. E empresa nenhuma na face da terra, em especial no Brasil, financia candidatos de graça. Portanto é bom notar quem financia estas campanhas para ver quais interesses os deputados vão defender depois de passar pelo incomodo processo de pedir votos ao povo.
Vamos começar pelo “grupo ético” do congresso. Gabeira, tido como exemplo de independência, recebeu 40 mil reais da união dos bancos brasileiros e 100 mil de uma empresa siderúrgica. Raul Jungman, do PPS, recebeu mais de 60 mil de indústrias farmacêuticas, 50 mil do Unibanco e 50 mil do Itaú, na sua cara campanha de mais de um milhão de reais. O Itaú inclusive é generoso, pois doou 100 mil para Paulo Renato, do PSDB de São Paulo, além de financiar as campanhas de outros deputados.
Vamos para os dois candidatos que disputaram as eleições. Chinaglia e Aldo receberam da construtora Camargo e Correa 70 mil e 200 mil respectivamente. Seria a disputa pela presidência da câmara uma disputa “dentro de casa”? Suas campanhas ficaram em torno de um milhão e quatrocentos mil reais cada, quantia parecida com o a direitista Paulo Renato. O comunista Rebelo inclusive recebeu 100 mil da companhia siderúrgica nacional(assim com Chinaglia, que recebeu 70 mil), que foi privatizada por FHC e 50 mil da Bolsa de Mercadorias e Futuros de São Paulo.
A tradicional direita coronelista diminui no Brasil porque com uma esquerda dessas ninguém precisa de direita. Os bancos, as faculdades particulares, as empresas que disputam licitações e a agiotagem que toma conta do nosso dinheiro está bem servida com nossos socialistas e comunistas do congresso. Isto é uma demonstração do quão falsa pode ser a esperança de ver a esquerda aumentar a cada eleição até que o socialismo chegue pela via do voto. As mortes de Miguel Arraes e de Brizola foram simbólicas neste sentido. Seus projetos de um Brasil desenvolvimentista, que pudesse trazer mudanças progressivas para a classe trabalhadora dentro do capitalismo se tornam cada vez mais inviáveis por causa da crise que o sistema passa.
Só para lembrar. As bancadas dos “três porquinhos” PP, PR(antigo PL) e PTB, que reúnem o esterco do esterco da política como Maluf, Severino chique-chique, Collor, Roberto Jéferson, entre outros, também cresceram nos últimos anos, especialmente depois da vitória de Lula. E os dados deste artigo só apenas de caixa um, quantia declarada pelo TSE.

domingo, novembro 05, 2006

DE SEATTLE A OAXACA. QUANDO SERÁ A VEZ DO BRASIL?

A ideologia do capitalismo liberal, sempre afoita por “novidades” e inimiga dos velhos dogmas deve estar em crise existencial. Afinal, eram os modernosos adoradores do novo mundo que criticavam as ideologias dos longínquos anos 60 que diziam que o mundo poderia viver em uma sociedade igualitária. Eram os anos 90 e a história havia terminado.
Hoje é sua ideologia que se vê ultrapassada, aquela dos longínquos anos 90. Desde a batalha de Seatlle, em 1999 surgiu um novo impulso das lutas populares. Uma nova onda de movimentos, junto com o reavivamento de alguns grupos de esquerda. A batalha dos explorados e dos desprivilegiados contra as elites começou a ser visível a olho nu e hoje chega a abalar os rumos da calmaria mundial. Começou na manifestação contra a reunião do G-8 em Seatlle, e teve conseqüência em várias outras como Quebec, Gênova, Cancun, entre outras. Junto a isto, mobilizações conseguiram varrer alguns países.
A Argentina começou, derrubando cinco presidentes em uma semana em 2001, com mobilizações que desafiaram um estado de sítio. A formação dos piqueteiros, dos movimentos de trabalhadores desempregados e dos movimentos das fábricas ocupadas ganha a cada dia mais consistência no país. Em 2002, foi a vez do povo Venezuelano derrubar um golpe das elites contra um governo eleito. Em 2004, o povo boliviano derruba “El gringo” Chancez da Losada do governo e do Equador derrubar um traidor de sua própria causa. Em 2005, os ventos de esquerda chegam ao primeiro mundo e fazem a França dizer um não à União Européia e fazer com que imigrantes causem incêndios de mais de dez mil carros por todo o país. Também no longínquo Nepal um grupo guerrilheiro consegue por o governo em cheque.
Em 2006, a nova onda de movimentos populares explode. A França põe milhões na rua contra os contratos de primeiro emprego. O Chile também faz mobilizações gigantescas pelo passe livre e põe a presidente do país em cheque. E finalmente, Oaxaca mostra uma alternativa de poder, com uma assembléia popular tomando conta do estado e exercendo um governo popular. As assembléias populares mostram que não é só possível, como necessário, que o povo exerça seu próprio governo.
A nova geração já tem a sua cara. Não defende revoluções de um pequeno grupo de iluminados e sim a insurreição de massa, a vontade do povo guiando os rumos. Já tem seus mártires, como Carlos Giuliani, morto em Gênova em 2002 e Brad Will, morto em Oaxaca. E já tem sua luta. Diante do entusiasmo dessas lutas, surge a pergunta para os ativistas tupiniquins: quando será a vez do Brasil.
O país já vê um Ascenso das lutas populares. Das mobilizações contra aumentos de passagens em Salvador e Florianópolis, das greves cada vez mais radicalizadas de bancários, petroleiros, servidores públicos e universidades. Do avanço dos movimentos de sem teto, que teve sua maior expressão na luta por moradia em Goiânia. Do avanço da luta pela terra, com o Abril vermelho de 2004 e da marcha de 2005 do MST. Por enquanto, lutas localizadas e reivindicações específicas. Mas o calor vindo de nossos vizinhos e o clima mundial indicam que até o fim da década o Brasil não fica incólume a uma mobilização popular maciça. Pelos menos é uma hipótese viável até para analistas da direita.
Devemos estar preparados, nosso dia virá. Dizer que o Brasil é um país de povo manso e conservador é coisa ultrapassada, lá dos anos 90.

quarta-feira, outubro 25, 2006

MTV GANHOU AS ELEIÇÕES ESTE ANO

É espantoso ver que o que mais influencia o horário eleitoral dos candidatos à presidência não é o programa e governo ou o programa de partido de cada um deles. Não é Duda Mendonça, Perseu Abramo ou Mário Covas que influenciam as campanhas televisivas de Lula e Alckmin. É Michael Jackson, com seu disco Thriller, que deu o tom das campanhas eleitorais.
Quando lançou Thriller nos anos 80, Michael estreou a era do vídeo-clipe. O disco foi o mais vendido de todos os tempos, e a estética e vídeos sobrepostos à músicas foi aperfeiçoada pela MTV. Os vídeo-clipes desde então passaram a ter grande popularidade. O curta-metragem em que várias cenas passam sem nenhuma conexão textual ou enredo virou um padrão. Com montagem cheias de cores, formas e montagens que duram poucos segundos e fazem epiléticos ter ataques de tão pesadas passaram a ser uma febre na juventude desde então. Eu mesmo, que não tenho TV a cabo, quando tenho a chance de ver MTV fico simplesmente hipnotizado.
A estética lisérgica e vazia lançada pela MTV nos anos 80 conseguiu dar o tom da campanha eleitoral dos candidatos à presidência neste ano. Uma sucessão de imagens, músicas, pessoas sorrindo, e seqüências que nunca duram mais de três segundos ocupam a maior parte do horário eleitoral. De vez em quando os candidatos aparecem para falar. Mas é na menor parte do tempo.
A overdose de números, muitos distorcidos e fora de contexto, é de fazer qualquer epilético ter ataque convulsivo. Todos os números são dados em valores absolutos. Milhões, Bilhões e Trilhões enchem os textos das campanhas, mas ninguém explica o que estes dados querem dizer de modo comparativo ou o impacto real que tem na sociedade. Qualidade de vida da população é levemente tocada. Muito IBGE, pouco DIEESE também é uma marca do show de números que não dizem nada para quem não os entende. E ninguém entende tudo, pois para entender alguns é preciso ser especialista em alguma área.
As imagens vão sempre no sentido de atingir o emocional direto, como um projétil que atravessa qualquer colete à prova de balas. Mulheres grávidas, pessoas sorrindo, gente bonita e alegre. A visão de um Brasil lisérgico mesmo. Diferente da “Rede Povo” da campanha de Lula de 1989, que sem ser fatalista como uma novela mexicana, mostrava a realidade do país.
Nesta campanha, a MTV vai ganhar as eleições. Talvez por isso a rede televisiva soltou uma vinheta chamando todos e repudiar os candidatos. Afinal foi ela que tomou o poder, mesmo a maioria das pessoas não tendo acesso ao festival de imagens sem sentido. Nas próximas eleições, experimentem fumar “unzinho” antes de assistirem o horário eleitoral, dá mais onda. E epiléticos, fujam da sala quando o horário começar.

terça-feira, outubro 17, 2006

SE LULA VOLTAR A FUMAR, EU VOTO NELE

Década de oitenta. Um grupo de repórteres cerca o então ex-sindicalista e fundador do Partido dos Trabalhadores para uma bateria de perguntas. Antes de esboçar qualquer reação, o entrevistado dá uma intensa tragada em seu cigarro na frente das câmeras, para depois responder sua pergunta.
Este era o Lula que fumava. Aliás, ainda fuma, mas em hipótese alguma na frente das câmeras. Afinal, o politicamente correto, o “marketing pessoal” diz que pessoas ilustres não podem ter atitudes demasiado humanas nos holofotes da imprensa. Barba aparada, terno impecável, dentes serrados. Lula foi moldado à risca para parecer qualquer coisa(de acordo com as pesquisas qualitativas), menos um ser humanos, que entre outros defeitos aceitáveis(falo aqui dos aceitáveis), fuma.
O marketing e rigor estético tomam conta do mundo político, que faz com que os políticos de hoje pareçam bonecos. Afinal, aparência e discurso dentro de padrões politicamente corretos é que dão votos. Já que o discurso programático faliu. Trocas de acusações, bem, estas se empatam em seu macabro jogo de pingue-pongue, não tendo efeito diferencial.
Vendo vídeos de debates antigos me impressiono. Os candidatos eram mais espontâneos. Falavam com mais freqüência o que dava em suas telhas. Hoje seria impossível o fantástico debate entre Maluf e Brizola nas eleições de 89. Brizola esbraveja, quase espumando: - filhote da ditadura! Maluf responde rindo: -ora, ficou quinze anos no exterior e não aprendeu nada. A platéia cai nas gargalhadas. Brizola, sem perder a pose, aponta o dedo para platéia e grita: -filhotes da ditadura, vocês são todos filhotes da ditatura! Isto sem falar nas várias tiradas, respostas, ironias e outras peripécias que marcaram os debates em 1989.
Os candidatos se pareciam mais humanos. Como foi durante toda a década de oitenta. As diferenças pareciam mais definidas. Direita parecia direita, sem medo de ser preconceituosa e elitista. Esquerda parecia esquerda, sem medo de ser utópica e populista. Nenhuma saudade das denúncias sobre vida pessoal alheia, é claro. Mas é bom lembrar que naquela época, em um Brasil que se abria para o regime liberal, o povo queria ver nos debates pessoas com quem se identificasse, sem a superioridade rançosa que os militares exalavam. Pessoas que fumam, que riem, e que têm preconceito.
Na atual eleição, a padronização estética acaba por camuflar o mal estar ético. As pesquisas de opinião substituem o feling dos políticos. O discurso político amorfo (um tipo de neoliberalismo politicamente correto) foi imposto pelas agências de publicidade para todas a legendas. As táticas comerciais transformam os candidatos em refrigerantes, destes que a gente bebe nos domingos e joga a garrafa fora. Não cabe espaço para autenticidade, esta não dá voto. É o que dizem os especialistas em escrever livros do tipo
“ conquiste o mundo em dez lições”.
Voto no Lula se ver ele fumando em frente às câmeras de novo. Se ele voltar a se mostrar para os holofotes ser um homem comum, que fuma, tosse, e tem alguma tique nervoso, passo a confiar nele. Uma pessoa assim tem menos o que esconder. Mas o que se verá nos debates entre Lula e Alckmin será dois homens educadinhos, arrumadinhos, politicamente corretos, perfumados, com português impecável e papagueando os chavões que seus marqueteiros lhes passaram. Como bonecos do estilo “comandos em ação”. E já passei da idade de me impressionar com bonecos.

sábado, outubro 07, 2006

LUTA DE CLASSES?

A esquerda petista, o PCdoB e boa parte dos movimentos socais colocam a eleição de Lula como expressão da luta de classes. De um lado, o proletariado votando em Lula, e por outro a burguesia votando em Alckmin. Afinal as pesquisas apontam que Lula é favoritíssimo nas classes mais baixas, no nordeste e entre os de menor nível escolar. E o que é mais notável: Alckmin ganha entre o que ganham mais de cinco salários mínimos, tem escolaridade e vive em São Paulo.
Neste contexto, o balanço do governo Lula, seu caráter neoliberal e a corrupção se tornam coisas secundárias. Esta visão é tão equivocada quanto quem há trinta anos achava que a expressão da luta de classes se dava na luta entre Estados Unidos(Nação “burguesa”, excluindo o proletariado ianque) e União Soviética(Nação operária).
É interessante notar: antes, o eleitorado do Lula era exatamente maior em São Paulo e entre a classe média(assalariada). Em Brasília, por exemplo, o PT é forte no Plano Piloto e Roriz(PMDB, encarnação do antipetismo) é forte nas cidades-satélites(com algumas exceções). Ou seja, agora a coisa se inverteu. Porque?
O eleitorado "neo-lulista" na verdade não vota em Lula, vota no governo. Sempre votou no governo e é sensível à grande mídia. Se Lula perde, perde este eleitorado. Claro que a imagem cosmética de Lula ajuda, mas o central é que a maioria do povo votou em Lula, mas em deputados, governadores e senadores do PSDB e PFL. Bahia foi exceção, onde o povo de fato rechaçou ACM votando em uma Frente Popular. Mas e a classe média que antes votava no Lula?
É a base social mais sólida que o PT tinha. Funcionários públicos, gente ligada à educação(estudantes, professores, intelectuais), operários de carteira assinada dos grandes centros(aí o PT ainda tem base, mas há crises), enfim quem fornecia até então matéria prima para a militância petista, que cada dia fica mais fraca. Na verdade não temos exatamente uma luta de classes com o pobre votando Lula e o rico votando Alckim. Mas uma espécie de "sanduíche": os mais pobres, assim como o grande capital especulador financeiro, é Lula. A classe média assalariada, assim como um setor da burguesia(notadamente industrial), é anti-Lula(Heloisa, Alckmin, nulo, Cristóvão), ficando no meio.
Isto se caracteriza pelo fato que um setor importante do capital financeiro, ou não tem preferência, ou até torce por Lula. E é justamente o setor mais regressivo da burguesia, que vive de juros. Os “capitalistas produtivos”, que seria o setor do empresariado que gera empregos, luta pela soberania nacional e é contra os juros altos, se existe, é contra Lula. O exemplo mais fascinante é José de Elencar, que foi vaiado pela esquerda petista na convenção de 2002, por representar a burguesia na candidatura de Lula e depois passou a criticar Lula, pasmem, pela esquerda, denunciando a alta taxa de juros.
Osvaldo Setúbal, dono do banco Itaú, portanto membro da grande elite, não é um entusiasta de Alckmin, mas declarou que “tanto faz”. Seu banco doou uma quantia de 7 milhões de reais para a campanha de Lula. Isto é apenas um exemplo que um setor das elites, na verdade a elite da elite, vota em Lula ou é indiferente. Os bancos aumentaram seus lucros em mais de 85% durante o governo Lula.
O mais importante é que este setor da burguesia não é apenas “um setor da burguesia”. É quem dita as regras da economia em nível mundial. É quem controla o sistema de capital bancário, que hoje dá a maior taxa de lucros. A burguesia “produtiva” tem atritos limitados com este setor, mas a unidade de classe acaba prevalecendo. Tanto que existe um esforço por todos os setores dominantes, incluindo a mídia e a oposição de direita, para manter a estabilidade do regime político.
A teoria do “golpismo de direita”, que alguns militantes passam, tentando nos convencer de que Lula é Chavez e Alckmin é Pedro Carmona(que liderou o fracassado golpe contra o venezuelano) não passa de ilusão estalinista. A direita não quer golpe nenhum, senão teria pedido impeachment em momento mais oportuno. A direita quer é mais espaço político, mais cargos, e infelizmente, Lula sempre cede a chantagem.
A disputa entre PSDB-PFL e PT não passa hoje de disputa de interesses comerciais. Nem mesmo é a disputa de uma Frente Popular, com setores da burguesia “progressista” junto com o movimento popular de um lado e a burguesia mais retrógrada de outro. Quanto mais é expressão de luta de classes. É bom lembrar que os “privilegiados” de que Lula e o PT falam na verdade é o funcionalismo público, o trabalhador de carteira assinada, o estudante universitário. Enfim, a classe média, que apesar de não estar na linha da pobreza se encontra entre os que vivem de salário, e não de capital. Quanto ao empresariado antilula, este se contenta em esperar as próximas eleições, afinal seus interesses centrais não foram atacados.
A luta de classes não está acirrada o suficiente para que se forme uma polarização. Setores da burguesia de dividem, setores do proletariado se dividem. Mas no atual contexto, a maior parte do proletariado acaba sendo refém dos interesses políticos da burguesia financeira, por intermédio da burocracia petista. O voto dos mais pobres em Lula para esta população não representa mais que um mal menor e a manutenção dos meios mínimos de sobrevivência, e não interesses próprios, mesmo dentro do capitalismo.
Para finalizar, é bom fazer uma análise de um artigo de Roberto Pompeu de Toledo, intelectual direitista, que disse em artigo recente que Lula é ruim, mas sua derrota geraria um mito capaz de mobilizar a população para uma forte oposição contra Alckmin. Ou seja, para burguesia é ruim com Lula, mas é pior sem ele, pois Lula cumpre o importante papel que o PSDB não consegue: manter os movimentos sociais sobre seu cabresto e vender ilusões ao povo.